24.5.14

O ASSASSINO SILENCIOSO



Atensão arterial alta é considerada como o assassino silencioso de muitos portugueses, que vivem no desconhecimento de serem suas possíveis vítimas. Novos estudos têm trazido luz sobre a sua prevalência em Portugal. Personalidades de grande relevo no nosso país, como o Sr. Prof. Fernando Pádua, reputado cardiologista, têm desempenhado um papel relevante no alerta de perigo relativamente a esse problema.
Mais de 25% da população mundial é hipertensa. Se nada for feito, em 2025 essa percentagem será de cerca de 29% (isto é, 1 em cada 3 pessoas no mundo poderá, dentro de 13 anos, ser hipertensa). Esta doença, que não “se sente”, é a origem de cerca de 50% dos problemas cardíacos e aproximadamente de 75% dos acidentes vasculares cerebrais.
Quando falamos de problemas é bom podermos falar de soluções. Felizmente, no caso da hipertensão, existe solução para diminuir o seu impacto. Através de uma estratégia natural (com base no estilo de vida e na alimentação), é possível alterar este cenário significativamente. Sabe-se hoje que a presença do nitrato contido em produtos, tais como a beterraba, é convertido em nitrito, graças ao contributo de bactérias existentes na saliva. Quando esta saliva atinge o estômago, é transformada pelos ácidos estomacais em óxido nítrico. Quando se mede o momento de maior acumulação de nitrito na circulação, constata-se que isso coincide com o maior nível de redução de pressão arterial.
É importante salientar que, neste estudo desenvolvido pela investigadora Amrita Ahluwalia, o mesmo não aconteceu com o grupo de comparação que bebeu o sumo de beterraba, mas sem que este tivesse contacto com a língua. O resultado foi então surpreendente: não houve diminuição da pressão arterial. Para a investigadora deste estudo, ficou assim revelado o potencial da beterraba em paralelo com o de vários tipos de medicamentos usados com este fim, i.e., o combate da pressão arterial alta.
Acessível à maior parte dos portugueses, este mês deixamos a sugestão de iniciar uma Horta do lar dedicando um espaço à plantação anual de beterraba. Isto é, com pouco mais de 1m2 poderá ter beterraba todo o ano, contribuindo assim para a prevenção não só da hipertensão mas para outros aspetos fundamentais do seu bem-estar.

Faça você mesmo!
Tenha Beterraba quase o ano todo!
A beterraba na alimentação diária
A origem da beterraba perde-se no tempo. As mais antigas reminiscências da beterraba selvagem proveem do Norte de África. Com os romanos, a raiz desta planta começa a ser usada na alimentação. Depois, com as invasões bárbaras, o uso da beterraba como alimento humano foi reforçado nos territórios outrora sob o poder militar romano. A popularização do seu consumo pelo ser humano acontece a partir do séc. XI, pois até aí era principalmente alimento para os animais. No séc. XIX há um recrudescimento de interesse pela beterraba, com a descoberta dos seus teores elevados de açúcar. A primeira fábrica de produção de açúcar a partir da beterraba foi construída na Polónia.

Preparar
A beterraba é utilizada desde há muito na culinária. Escolher o mês de maio para preparar a horta para o cultivo da beterraba não é mais do que uma necessidade pragmática de apresentar o tema na medida em que durante todo o ano é possível ter uma horta a produzir esta raiz. Portugal, com o seu clima temperado, é um ambiente perfeito para produzir esta planta que gosta de temperaturas entre os 7 e os 22 graus. Para obter o melhor resultado, o terreno deve ser lavrado até 30cm de profundidade, com um equilíbrio de areia e argila. Enriquecer com matéria orgânica, criar condições para ele ser bem drenado e verificar que a acidez é fraca (compensado no caso de não ser) são algumas características a ter em conta na preparação do terreno (ph ideal entre os 6,0 e 8,0). 
O enriquecimento do terreno pode fazer-se na base de 10kg por m2 de esterco de curral bem curtido, ou, melhor ainda, através de compostagem na mesma proporção.

Beterraba_79736593.jpgSemear
Durante a época mais fria (em que a temperatura possa descer abaixo dos 7 graus) poderá proceder-se a uma sementeira em viveiro a partir dos meados do mês de dezembro, e o respetivo transplante mais tarde. Mas, em Portugal, o tempo ideal para semear a beterraba é principalmente a partir de janeiro/fevereiro. O terreno, bem exposto ao sol, deve ter sido bem cavado e gradado. Antes de se semear, é conveniente mergulhar as sementes durante 12 horas em água, pois isso irá facilitar a germinação. 
Após decorridos alguns dias, e quando as plantinhas tiverem alcançado 5cm de altura, procede-se ao desbaste, deixando 20cm de distância entre as plantas.

Plantar
Em zonas de grande frio pode-se semear em pequenos copos as sementes, em lugar abrigado exposto ao sol, e colocar em terra depois de nascidas. 
As sementes (3 a 5) são agregadas em glomérulos, e semeadas em linhas cuja distância entre si deverá rondar os 30 centímetros e colocadas na terra a 2cm de profundidade. 
Se se tratar de um inverno seco, regue de manhã cedo e à tarde até as sementes germinarem. Depois, bastam regas frequentes (uma vez por dia). Conte com cerca de 50 a 100 dias para colher as beterrabas. Pode ter assim colheita permanente de beterrabas! As beterrabeiras deverão ter a raiz (que é a beterraba) coberta de terra. Se a beterraba aparecer à superfície, tapar com terra para que não seja visível. Assim, não ficará lenhosa. 
Podem encontrar-se vulgarmente três tipos de beterraba: a açucareira (para produção de açúcar), a forrageira (para alimentação animal), e a comum na horta, cujas raízes são de cor vermelha escura.

Colheita
Sementeira
Plantação de bolbinhos ou plantas
A beterraba pode ser plantada ao longo de todo o ano.

Cuidar
Ao cuidar da planta, evita-se que ela seja afetada pelas moléstias mais frequentes, tais como a podridão da raiz, a mancha alternária (folhas) ou a ferrugem, a mosca da beterraba, a traça, o oídio ou o míldio. É uma planta que gosta do sol, resiste à geada (embora na fase inicial de crescimento possa ser afetada pelo frio intenso). Por isso, tê-la ao abrigo nos primeiros 20 dias de germinação ajudará a planta a maturar normalmente. É uma planta bem tolerante à temperatura elevada do verão, o que faz dela uma boa candidata a uma horta mediterrânica. Ter em conta, como foi anteriormente dito, que a raiz (usualmente designada por beterraba) não deve ser visível à superfície. Por outro lado, como as folhas são comestíveis, proteger o território envolvente das plantas com palha (restos de relva seca) evita o crescimento de ervas daninhas, evitando assim a competição dos recursos do solo por plantas concorrentes.

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 Colher
O tamanho das raízes determina a boa altura da colheita. Existem dois critérios a ter em conta: se se pretende colher a rama, a colheita faz-se 50 a 70 dias após a sementeira. Se se pretende não consumir a rama, então considerar 75 a 100 dias após a sementeira, evitando a maturação completa da raiz.
Feita a colheita, as beterrabas poderão ser guardadas ao ar livre enquanto os dias são de sol e não arrefecem. Depois, convém guardá-las num lugar seco, ou aproveitá-las como decoração no interior da habitação, até que sejam utilizadas na culinária familiar.

Cozinhar
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 Nutrir 
A beterraba sobressai por ser um vegetal muito doce (rico em açúcar) e pela sua riqueza em ferro. Também é rica em vitaminas A, B1, B2, B5, C, potássio, sódio, fósforo, cálcio, zinco e manganésio. De acordo com alguns pesquisadores, a vitamina C da beterraba é metabolizada pelo organismo se esta for consumida crua. A sua importância é muito grande, na medida em que a vitamina C reforça a sua ação antioxidante. Alimentos com conteúdo de antioxidantes são úteis no combate às infeções.
Pelo seu alto teor em ferro, a beterraba é um potente auxílio no combate à anemia. Para além disso, e graças à sua fibra, combate a prisão de ventre, a perda de líquidos, as disfunções do fígado e baço. 
Entre as vitaminas do grupo B, está o ácido fólico no qual ela é rica. Isto é relevante para a gravidez, pois, além de combater a anemia, diminui o risco do desenvolvimento de espinha bífida no feto.
Foi recentemente descoberta a relevância da beterraba na proteção de problemas cardiovasculares. Em 2008, o American Journal of Clinical Nutrition clarificou o papel da descida da homocisteína plasmática seis horas após a ingestão da beterraba, devido à betaína. 
Também, nesse mesmo ano, a revista Hypertension (abril de 2008), revelou que ingerir 500ml de sumo de beterraba por dia permite diminuir a pressão sanguínea (diminui uma hora depois da toma do sumo e acentua-se nas três a quatro horas posteriores, mantendo-se durante 24 horas). 
O princípio ativo da betaína tem propriedades antitumorais e anticancerígenas. No entanto, é interessante constatar que, ao ser aplicada isoladamente, leva a efeitos adversos (a nível hepático). Por isso, é no consumo de toda a raiz que se potenciam os seus efeitos benéficos. A betaína tem propriedades hepatoprotetoras e hipocolesterolemiantes.

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Sugestões e soluções 
A beterraba pode ser aproveitada quase na sua totalidade e em várias formas, na medida em que, quer a raiz quer as folhas, podem ser consumidas. As suas folhas são muito nutritivas e podem ser preparadas para ser comidas como se fossem espinafres ou acelgas. Ao ser cozinhada crua ou cozida, permite uma variedade de pratos. Também pode ser consumida em sumo, saladas, refogados, bolos. As folhas permitem fazer refogados, bolos ou omeletas. Quando se fazem crescer as beterrabas numa horta, as médias e pequenas são as melhores, mais saborosas e sumarentas. Repare na aparência da casca (se está lisa) e se as folhas estão brilhantes. É assim que convém consumi-la. 
A beterraba é hoje usada na Europa e no Brasil para acompanhar o esforço da diminuição do consumo de matérias fósseis. Deste modo, a beterraba está na base da produção de etanol como combustível. 
A conservação da beterraba passa por colocá-la em ambiente frio, ou cortada em cubos, num saco de plástico e congelar (dura até 8 meses). Ao ralar a beterraba use-a imediatamente pela perda rápida das suas características nutritivas.
O benefício da beterraba faz-se também sentir a nível do fortalecimento do sistema imunitário, da memória e da concentração, graças ao teor de ferro. O açúcar natural que ela contém, por sua vez, fortalece e revigora fisicamente. Num estudo desenvolvido em Exeter, na Grã-Bretanha, constatou-se que atletas que consumiam beterraba conseguiam exercitar mais 16% do seu tempo. O consumo de oxigénio é reduzido pelo nitrato da beterraba, o que permite aumentar a resistência das pessoas – este benefício permite auxiliar pessoas com doenças respiratórias e metabólicas. 
A beterraba é uma aliada da oncologia (reduz os efeitos secundários da quimioterapia e aumenta a eficácia do tratamento). Protege o fígado e a vesícula biliar, reduz o colesterol, purifica o sangue, combate os cálculos renais e é útil na homocistinúria (doença diagnosticada pelo teste do pezinho), contribuindo assim para controlar a homocisteína no sangue e prevenir AVC's e enfartes.
A beterraba é uma aliada, igualmente, no tratamento da leucemia, devido às propriedades de limpeza do sangue. 
Pelo facto de ter açúcar não significa que seja prejudicial para a saúde, pois trata-se de açúcar na sua forma natural. Assim, porque é muito pouco calórica, acaba por ser uma aliada no controlo do peso. 
Rica em hidratos de carbono, é ainda um anti-inflamatório natural. Permite atenuar as consequências da menstruação, ajudando a regular o ciclo menstrual e a reduzir problemas ligados à menopausa. O seu papel é relevante no sistema linfático, que constitui a base de defesa do organismo em caso de doença. 
Meio copo de sumo de beterraba contém 45 microgramas de folato [um quarto da IDR (Ingestão Dietética Recomendada)] e 5mg de vitamina C; as folhas são mais nutritivas: 
1 copo fornece 35mg de vitamina C (mais de metade da IDR para adultos), 720 equivalente de retinol de vitamina A, 160mg de cálcio, 2,5mg de ferro e 1300mg de potássio.

Luís Nunes
Sociólogo da Medicina e da Saúde, MPH, PhD


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